domingo, 5 de outubro de 2008

Você acha engraçado?

Estava lá eu, fazendo sei lá o quê.
Talvez estivesse só deitada, olhando pro teto e pras minhas meias.
Vendo a luz.
Colocando um pé na frente da luz, depois o outro.
E depois o outro.

Tocou o interfone, campainha, telefone, sei lá.
Tocou.
Fui atender.
Ah, era a campainha.
Pelo olho mágico deu pra ver pouca coisa.
Porque o que tinha ali era coisa pouca mesmo.
Abri a porta.

Olha, uma menininha.
Cabelos negros e compridos.
Cabeça baixa.
Céus, quem é você?
...
Quer entrar?
Então me olha nos olhos, e eu quase me perdi naquele oceano que eram seus olhos.
Entrou, se sentou.
Sem a menor cerimônia, mas super cerimoniosa.
Peguei água, como se adivinhasse que ela tinha sede.

Tomou a água em goles pequenos, leves.
Quase dava pra sentir.

Quer conversar?
Só me olhou de novo com aqueles olhos fundos, de cores indefinidas.
Esboçou um sorriso, que foi a coisa mais linda que já vi.
Colocou docemente o copo na mesa, apertou os dedos.
Baixou os olhos.
Quis abraçar, quis segurar ali comigo, para sempre.
Mas meus braços não eram suficientes.
Me faltaram braços, ou talvez coração.
Quer ficar aqui para sempre?
Eu sempre estive aqui. Você não percebeu?

Silêncio.

Então ela se acomodou num canto qualquer.
Se embolou com almofadas e tapetes velhos.
Dormiu.
Então fiquei ali, imóvel.
Vendo aquela coisa tão pequenina, com um rosto marcado de lágrimas.
Lágrimas que ela mesma se recusou a enxugar.
Como se fossem cicatrizes, marcas.
Coisas que não se pode apagar.

Sem saber, adormeci.
Ali sentada mesmo.
Com uma mão segurando o queixo.

Já amanhecia, e eu dormia.
Dormia e sonhava com qualquer coisa.
Tinha lenços, vento, cores.
Acordei.

Aonde ela está?
Aonde foi?
Como posso ficar sem?
Ela vai voltar?

Ela sempre esteve aqui.

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